domingo, 27 de dezembro de 2020

“Tem-te-igual” face à moraima

Igreja de Tentúgal
Igreja de Tentúgal
Luis Dufaur
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Entre a cidade de Coimbra e a Vila de Montemor-o-Velho fica a aldeia de Tentúgal que hoje é uma pequena povoação mas que nos tempos de primeira dinastia era uma posição fortificada bastante importante, defendendo a passagem do Mondego.

Os mouros tinham sido escorraçados até ao Algarve.

Mas os dois sucessores do conquistador de Silves não foram lutadores como os dois primeiros reis portugueses e eram freqüentes as incursões sarracenas que, vindas da Andaluzia, atravessavam o Guadiana e vinham assolar as terras reconquistadas.

Os portugueses eram senhores dos castelos e quando os mouros faziam os seus fossados, as populações rurais, ainda mozárabes, isto é mistas de católicos e árabes convertidos, refugiavam-se atrás das ameias.

Os mouros faziam correrias até o Tejo, passando pelos campos e montes entre as praças-fortes e apoderavam-se das colheitas e do gado que podiam recolher. 

domingo, 13 de dezembro de 2020

São Nicolau: bispo inflexível que obteve o impossível

São Nicolau ressuscita um jovem, Ambrogio Lorenzetti.
Luis Dufaur
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QUANDO O SENHOR quis chamá-lo a Si, ele pediu-Lhe que lhe mandasse os seus anjos. 

Então, inclinou a cabeça, viu os anjos que se dirigiram a ele, e logo se deitou no chão, munindo-se com o crucifixo e, dizendo o Salmo “Em Ti, Senhor, esperei ...” até “nas tuas mãos”, e entregou o espírito, no ano do Senhor de 343, enquanto se ouvia a melodia dos coros celestes.

Foi sepultado num sepulcro de mármore; da cabeceira brotava uma fonte de azeite e dos pés uma fonte de água; e, até hoje, tem emanado dos seus membros um óleo sagrado que restituiu a saúde a muitos.

Sucedeu-lhe um homem bom que, por invejas, foi deposto da sua cátedra; desde que foi deposto, o azeite deixou de correr, voltando a fluir logo que para ela voltou a ser chamado.

Passado muito tempo, os turcos destruíram Mira, mas quarenta e dois soldados de Bari foram lá com quatro monges que lhes mostraram o túmulo de São Nicolau; abriram-no e levaram com toda a reverência os seus ossos, que nadavam em azeite, para a cidade de Bari, no ano do Senhor de 1087.

domingo, 6 de dezembro de 2020

São Nicolau padroeiro dos navegantes, inimigo do diabo e da idolatria, terror dos maus governantes

São Nicolau salva os marinheiros, Museu de San Marco, Florenca
Luis Dufaur
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CERTO DIA, alguns marinheiros que estavam em perigo, dirigiram-lhe por entre lágrimas esta oração:

‒ Nicolau, servo de Deus, se é verdade o que ouvimos a teu respeito, faz que agora o experimentemos.

Imediatamente lhes apareceu alguém parecido com ele, que lhes disse:

‒ Eis-me aqui, pois me chamastes!

E começou a ajudá-los nos mastros, nos cabos e nos outros aparelhos da nau, e logo a tempestade cessou. 

Depois, quando foram à sua igreja, reconheceram-no, embora nunca o tivessem visto nem alguém lho indicasse. Então deram graças a Deus e a ele pela sua salvação; o Santo, porém, ensinou-os a atribuir o milagre à misericórdia divina e à fé que haviam demonstrado, mas não aos seus méritos.

HOUVE TEMPO em que toda a região de São Nicolau foi assolada por uma fome tão grande que todos ficaram sem alimentos. 

Quando o homem de Deus ouviu que estavam no porto uns barcos carregados de trigo, foi logo lá e pediu aos marinheiros que lhe dessem, ao menos, cem moios [antiga unidade de medida] por cada nave, para matar a fome aos que estavam em perigo. Eles responderam-lhe:

domingo, 29 de novembro de 2020

São Nicolau: virtude heróica e senso do maravilhoso até hoje

São Nicolau sagrado bispo
Luis Dufaur
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Em 1993, uma equipe de arqueólogos descobriu na ilha de Gemile, Turquia, um centro de peregrinações composto de quatro igrejas, um caminho processional e uma quarentena de prédios em torno do primeiro túmulo de São Nicolau (+ 326).

O conjunto foi arrasado pelo furor maometano, mas as relíquias do santo foram salvas e levadas a Myra, e hoje se veneram em Bari (Itália).

É o famoso São Nicolau de Bari.

A história do santo bispo, que numa noite de Natal lançou pela janela os dotes a três moças pobres, possibilitando assim seu casamento, está na origem da tradição dos presentes natalinos.

A deturpação hodierna de São Nicolau deu no Papai Noel mas não desqualifica em nada essa bela tradição.

Enquanto o Natal se aproxima é proveitoso conhecermos mais da vida desse santo que marcou tão a fundo os costumes cristãos.

O Bem-aventurado Jacques de Voragine, arcebispo de Genova, escreveu uma história do Santo cheia de unção poética. A festa é o 6 de dezembro.

domingo, 22 de novembro de 2020

Como Frei João do Alverne conheceu toda a ordem da santa Trindade

Luis Dufaur
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O Frei João do Alverne, porque perfeitamente havia renunciado a todo deleite e consolação mundana e temporal, e em Deus havia posto todo o seu deleite e toda a sua esperança, a divina bondade lhe dera maravilhosas consolações e revelações, especialmente nas solenidades de Cristo.

Pelo que, aproximando-se uma vez a solenidade da Natividade de Cristo, na qual esperava de certo consolação pela doce humanidade de Jesus, o Espírito Santo pôs-lhe na alma tão grande e excessivo amor e fervor da caridade de Cristo, pela qual ele se tinha humilhado, tomando a nossa humanidade, que verdadeiramente lhe parecia ter sido tirada sua alma ao corpo e arder como uma fornalha.

O qual ardor não podendo suportar se agoniava e se derretia inteiramente e gritava em altas vozes; porque, pelo ímpeto do Espírito Santo e pelo excessivo fervor do amor, ele não se podia conter de gritar.

E na hora em que aquele desmesurado fervor lhe vinha, com ele lhe vinha tão forte e certa a esperança de sua salvação, que por nada deste mundo acreditara que se então morresse devesse passar pelas penas do purgatório. 

E aquele amor lhe durou bem um meio ano, ainda que aquele excessivo fervor não fosse continuado, mas lhe viesse em certas horas do dia.

domingo, 8 de novembro de 2020

O jovem frade que abominava a túnica

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Um jovem muito nobre e delicado veio para a Ordem de São Francisco: o qual depois de alguns dias, por instigação do demônio, começou a ter tal abominação ao habito que vestia, que lhe parecia trazer um saco vilíssimo.

Tinha horror às mangas, abominava o capuz, e o comprimento e a grandeza lhe pareciam carga insuportável.

E crescendo-lhe assim o desgosto pela Ordem, deliberou finalmente deixar o hábito e voltar ao mundo.

Tomara por costume, conforme lhe ensinara seu mestre, todas as vezes que passavam em frente do altar do convento, no qual se conservava o corpo de Cristo, ajoelhar-se com grande reverência e tirar o capuz e inclinar-se com os braços em cruz.

Sucedeu que naquela noite, na qual devia partir e deixar a Ordem, foi-lhe preciso passar diante do altar do convento; e passando, segundo o costume, ajoelhou-se e fez reverência.

E subitamente arrebatado em espírito, foi-lhe mostrada por Deus uma maravilhosa visão: repentinamente viu diante de si passar quase infinita multidão de santos como em procissão, dois a dois, vestidos todos de belíssimo e precioso pano.

As faces deles e as mãos resplandeciam como o sol, e iam com cânticos e música de anjos, entre os quais santos havia dois mais nobremente vestidos e adornados do que todos os outros.

domingo, 25 de outubro de 2020

Um rei justo

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Eu vos quero contar uma coisa que tal vez vos parecerá excecional.

Eu ouvi dizer que o rei [São] Luis foi um homem muito de Deus e foi muito sábio.

Houve então alguns homens que queriam lhe pedir uma absolvição.

Queriam lhe pedir por um fulano que estava na prisão por um homicídio.

Combinaram, então, ir lhe pedir a graça numa Sexta-feira Santa, e assim fizeram.

Se apresentaram, e falou um que já estava apalavrado com os outros, e disse:

“Santa Coroa, nós vos imploramos uma clemência por amor de Nosso Senhor Jesus Cristo, Quem num dia como o de hoje quis morrer pela salvação do gênero humano para libera-lo dos laços com que estava amarrado nas mãos de seu inimigo”.

Falou assim em grande e agradável discurso.

Por fim, quando chegou à conclusão, todos disseram:

“Entrega-nos a fulano que tendes trancafiado na prisão”.

São Luis, respondendo disse:

domingo, 11 de outubro de 2020

O cavaleiro e o pacto com o diabo

Gárgula, da catedral Notre Dame de Paris.
Gárgula, da catedral Notre Dame de Paris.
Luis Dufaur
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Um cavaleiro nobre, poderoso e rico despendeu todos os seus bens e caiu em muito grande miséria. Tinha uma esposa muito casta e devota da Santíssima Virgem Maria.

Havendo uma grande festa na cidade, o cavaleiro queria fazer muitas despesas, mas não tinha mais dinheiro. Por vergonha, foi se esconder numa mata até que passasse a festa.

Estando ele naquele lugar, apareceu-lhe uma criatura muito espantosa em um cavalo assustador, e perguntou-lhe por que estava assim tão triste.

O cavaleiro contou-lhe toda sua história. E a criatura espantosa lhe disse:
— Se quiseres fazer o que eu te mandar, eu te farei ter mais riquezas e mais honras que antes.

O cavaleiro lhe prometeu que faria tudo o que ele quisesse, se ele cumprisse o que estava prometendo. E o demônio lhe disse:
— Vai à tua casa e cava um lugar. Acharás muito ouro. E promete-me que tal dia trarás aqui a tua mulher.

O cavaleiro prometeu. Foi para casa e achou muita riqueza, segundo lhe dissera o diabo, e começou a viver como antes.

domingo, 27 de setembro de 2020

O camponês avarento

Cidade de Colmar, Alsácia, França, no Natal
Cidade de Colmar, Alsácia, França, no Natal
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Um dia Nosso Senhor Jesus Cristo, viajando na Alsácia, foi surpreendido pela noite à entrada de uma aldeia. 

Procurou uma casa onde pudesse pedir pousada, mas as portas todas estavam fechadas, não se via nem um raio de luz através das janelas.

Tudo estava adormecido. 

Apenas no fim de um beco se ouvia o barulho de um mangual com que se bate o trigo, e nesse sítio havia uma pequenina luz. 

 Nosso Senhor dirigiu-se para lá, chegou rente ao muro de uma quinta e bateu à porta. 

Logo depois veio um camponês atender. 

domingo, 13 de setembro de 2020

Como Deus apareceu a São Francisco e companheiros enquanto falavam de Deus

São Francisco pregando aos pássaros. Benozzo Gozzoli (1421 - 1497) Capela de Capela de São Francisco, Montefalco, Itália
São Francisco pregando aos pássaros. Benozzo Gozzoli (1421 - 1497)
Capela de Capela de São Francisco, Montefalco, Itália
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Estando São Francisco uma vez, nos princípios da Ordem, recolhido com os seus companheiros a falar de Cristo, em um convento, no fervor de espírito mandou a um deles que em nome de Deus abrisse a boca e falasse de Deus o que o Espírito Santo lhe inspirasse.

Obedecendo o irmão à ordem e falando maravilhosamente de Deus, São Francisco lhe impôs silêncio e mandou a outro irmão que fizesse o mesmo.

Obedecendo este, e falando subtilissimamente Deus, São Francisco lhe impôs o silêncio e ordenou ao terceiro que falasse de Deus.

O qual semelhantemente começou a falar tão profundamente das coisas secretas de Deus, que certamente São Francisco conheceu que ele, como os dois outros, falava pelo Espírito Santo.

domingo, 30 de agosto de 2020

Legenda da fidelidade

Santa Ada, Giotto di Bondone
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Conta-se que em tempos muito remotos havia um convento de monjas agostinianas, perto da cartuxa de Monte Alegre.

Havia entre elas — e era, por certo, a mais humilde — uma monja de família nobre, de alta linhagem e muito bela.

Numa tarde, um cavaleiro que habitava nos arredores do castelo desse lugar, por acaso viu-a no jardim, e de tal maneira impressionou-se por sua beleza, que não teve mais repouso.

Desde então o cavaleiro rondava todas as noites o jardim do convento, chegando ao extremo de escalar os muros e cantar em frente à cela da enclausurada.

Esta teve notícia dos padecimentos do jovem cavaleiro, e chorou amargamente por ser causa deles.

Sua humildade e sua religião não podiam suportar a situação que o cavaleiro lhe criava, rondando-a como se fosse do mundo.

domingo, 16 de agosto de 2020

O pregador sutil que confundia os simples

Adaptação de 'O sono da razão produz monstros',  Francisco de Goya y Lucientes (1746-1828), Museo del Prado
Adaptação de 'O sono da razão produz monstros', 
Francisco de Goya y Lucientes (1746-1828), Museo del Prado
Luis Dufaur
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Houve um frade da nossa ordem que era muito bom para pregar.

E falava com tantas sutilezas, mas tão sutil que era uma maravilha.

Era mais fino que o mais fino fio que podem fiar as moças.

Esse frade tinha um irmão de religião que era completamente o oposto.

Ele era grandão, e dos grosseiros, que causava assombro só de vê-lo tão grande que ele era.

Ele acostumava ir ouvir os sermões desse sutilíssimo irmão dele.

Um dia, aconteceu que depois de ouvir a pregação, tendo se reunido com os outros num círculo de outros frades, ele lhes perguntou:

“Ó vós, que assististes nesta manhã à pregação de meu irmão, que coisas nobres disse ele?·

Eles responderam: “O que ele disse? Oh! ele disse as coisas mais nobres que você já ouviu”.

“Então, contem-me o que ele disse”.

E eles contestaram: “Ele falou das coisas mais nobres do céu, mais do que tudo que jamais se ouviu”.

E acrescentaram: “por que? você por acaso não veio? Não acreditas que ele tenha dito as coisas mais nobres!”

domingo, 2 de agosto de 2020

Pouco devemos acreditar no demônio (Cantiga 190)

Madonna del Soccorso, Ascoli Satriano, Itália
Madonna del Soccorso, Ascoli Satriano, Itália
Luis Dufaur
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Esta cantiga nos conta o poder de Santa Maria contra as insídias do diabo.

Devemos ter em pouca conta o demônio.

Assim sempre Deus me tenha, porque a Virgem vai nos guardar.

É Ela que nos conduz, é a Virgem que vai nos proteger.

Com pouco juízo obraremos se tivermos o demônio em conta de algo, pois a Virgem nos sustenta-

Ela nos conduz, porque é a Virgem que nos mantém.

Porque o poder do diabo pouco vale, porque de seu mal nos protege a Virgem espiritual que nos conduz; a Virgem espiritual.

O saber das trevas pouco nos causa dano, pois nosso lume e nossa luz é Aquela que viu seu Filho numa Cruz-

domingo, 19 de julho de 2020

Para cada doença, seu remédio

Médico fazendo uma sangria
Médico fazendo uma sangria
Luis Dufaur
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Quem está doente do estômago, vai ao médico.

Mas se lhe ocorre encontrar solução no que está nos livros e diz: “eu quero me curar segundo este autor” vai ler desde o início o livro onde estão os remédios para se curar da cabeça.

E assim achará o remédio que está escrito, mas nunca vai sarar com ele.

Por isso se deve saber que o médico deve procurar as coisas que o doente precisa.

Mas se tu vãs à consulta querendo um remédio determinado dizendo: “dai-me tal e tal coisa” o médico pega o primeiro vidro ou pó que encontra e o dá ao enfermo que não vai curar com isso.

Então se o doente tem necessidade de um remédio que cura o estômago, ele lhe dá um remédio para lhe curar a cabeça ou o braço, e não sarará mais.

domingo, 5 de julho de 2020

A origem das pérolas

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Tombou Abel, assassinado pelo invejoso e cruel irmão.

Impulsionada pelo instinto materno, tentou Eva reanimar o filho morto, acariciando longamente seu corpo exânime.

Quando se convenceu de que Abel não despertava mais, desconsolada e aflita, caminhou longa jornada até junto à praia do mar, e aí quedou-se a olhar, assombrada, a extensão das águas até então desconhecidas.

Nesse momento afloraram-lhe aos olhos suas primeiras lágrimas.

Uma após outra, rolaram silenciosamente pela face, e foram cair sobre as pétalas de

domingo, 21 de junho de 2020

A lenda do desterrado


Luis Dufaur
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Quem tem pecado muito e teme por sua salvação, que ouça uma lenda alemã adequada.

Um pobre desterrado retornava à pátria após 30 anos de ausência.

Os padecimentos haviam-no encanecido, e o haviam tornado irreconhecível.

À entrada do lugar, topou uns companheiros de sua juventude e estendeu-lhes a mão para saudá-los.

Mas eles recusaram o cumprimento, pois não o reconheceram.

O desterrado foi adiante e viu um irmão seu, com quem havia trabalhado, comido e dormido.

Chamou-o, mas o outro não o reconheceu e o fitou com desprezo.

Pobre desterrado! Entrementes era insultado pela garotada, e mantido debaixo do olho da polícia. Dando mais uns passos, viu à sacada sua irmã.

Gritou a ela, com afeição:

domingo, 7 de junho de 2020

O enforcado de La Piroche

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La Piroche é uma aldeia que deve ser como todas as outras; a ação se desenrola justamente em 1448; que um dos dois homens é o pai do outro, ambos camponeses, e vão trotando em seus cavalos a uma velocidade até razoável, tendo em vista que carregam camponeses.

— Será que chegaremos a tempo? — perguntava o filho.
— Sim. Vai ser às duas horas, e pela posição do sol deve ser ainda meio-dia.
— Não quero perder, pois tenho muita curiosidade em ver como é. Vão enforcá-lo com a armadura que roubou?
— Exatamente.
— Onde já se viu, o sujeito ter a idéia de roubar uma armadura!
— O difícil não é ter a idéia...
— É ter a armadura, eu bem sei — atalhou o filho, aderindo à brincadeira do pai. — E a armadura era boa?
— Dizem que era magnífica, toda marchetada de ouro.
— E o pegaram quando a levava?
— Sim. É fácil compreender que uma armadura não concorda em ser roubada sem montar um escarcéu de todo tamanho. Ela não queria abandonar o dono.
— Era de aço, e deveria ser muito pesada.
— O ruído que ela produzia despertou o pessoal do castelo.
— E logo puseram a mão no ladrão?
— Não exatamente assim. Primeiro ficaram com medo.
— Quem é roubado sempre sente medo dos ladrões. Se não fosse assim, os ladrões não levariam nenhuma vantagem.

domingo, 24 de maio de 2020

Um olho por minha Mãe


Luis Dufaur
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Um menino órfão que vivia aos cuidados dos padres da Catedral de Notre Dame, começou a andar um pouco triste e pensativo.

O padre vendo a tristeza no rosto inocente se aproximou e perguntou-lhe:

– O que está acontecendo? Por que tens andado pensativo e tão triste?

– É que eu vejo que muitos meninos tem uma mãe para poderem abraçar, mas eu não tenho nenhuma – respondeu o menino.

O padre se compadecendo da situação daquele menino inocente, lhe falou com um sorriso caridoso:

– Meu filho, você não sabe que você tem a Mãe mais bonita de todas as Mães? Para as crianças órfãs, Nossa Senhora assume uma maternidade toda especial.

Todo contente e já confortado, saiu de lá com a convicção alegre de que sua Mãe era a mais bonita de todas as Mães…

Toda a vez que ia à Catedral, rezava de modo mais especial, porém com um pedido inesperado: o menino queria ver sua Mãe pessoalmente.

Para isso não só rezava, mas fazia sacrifícios também.

domingo, 10 de maio de 2020

Como Santa Clara foi miraculosamente transportada, na noite de Natal, à igreja de São Francisco e aí assistiu ao ofício


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Estando uma vez Santa Clara gravemente enferma, tanto que não podia ir dizer o oficio na igreja com as outras freiras, chegando a solenidade da Natividade de Cristo, todas as outras foram a Matinas.

E ela ficou sozinha no leito, malcontente por não poder juntamente com as outras ir e ter aquela consolação espiritual.

Mas Jesus Cristo, seu esposo, não querendo deixá-la assim desconsolada, fê-la miraculosamente transportar à igreja de São Francisco e assistir a todo o ofício e à missa da meia-noite.

E, além disto, receber a santa comunhão e depois ser trazida ao leito.

domingo, 26 de abril de 2020

O menino que dava seu pão ao Menino Jesus

"Siempre Real Santo Niño de Malolos", Filipinas
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Vivia na cidade de Veneza um homem muito rico. Sua grande fortuna lhe permitia uma vida de luxo e comodidades.

Mas ele estava entristecido, sem poder desfrutar nada, pois todos os seus filhos morriam.

Tinha o coração triste, e nada o podia consolar.

Com satisfação trocaria todas as suas riquezas pelos filhos, embora ficasse na miséria, mas com eles.

Um único filho pequeno lhe restava.

Amedrontado com a ideia de perder também aquele, confiou-o ao abade de um mosteiro, convencido de que só a intervenção divina poderia conservar-lhe a vida.

O menino cresceu no mosteiro, em meio à dedicação de todos os monges, que gostavam dele e o atendiam.

Sempre alegre, percorria os claustros ou brincava nos jardins, onde admirava as flores ou comia os frutos que colhia.

Ele era o único menino ali.

Um dia, enquanto tomava sua merenda, entrou pela primeira vez na igreja, impressionando-se com a suntuosidade.

Ficou admirando com grande curiosidade a imagem da Virgem, que tinha nos braços o Menino Jesus, e alegrou-se por encontrar ali outro menino como ele.

domingo, 12 de abril de 2020

O escorpião de frei Anselmo

Luis Dufaur
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D. Lourenço de Baena, homem bondoso e simples, possuía uma considerável fortuna. Um dia, porém, aconteceu que a má sorte entrou em sua casa, e desde então as calamidades se sucederam numa série ininterrupta.

Um de seus barcos, que regressava com tecidos da China, foi saqueado pelos piratas. Naufragou outra caravela de mercadorias, que D. Lourenço havia comprado.

Enviou um comboio de prata às províncias do Ocidente, e os índios o assaltaram. Mas não foi isto o pior.

Seu filho único, que ia neste comboio, foi escalpelado pelos índios. Sua esposa, esgotada pela dor, morreu algum tempo depois.

D. Lourenço sofria tudo com cristã resignação. Quando sua ruína foi completa, seus amigos o abandonaram, e teve que vender sua casa e até seus móveis.

domingo, 29 de março de 2020

A cilada dos bruxos

As Bruxas de Macbeth, Alexandre-Marie Colin (1798-1875), col. priv
As Bruxas de Macbeth, Alexandre-Marie Colin (1798-1875), col. priv
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Mons. Balduíno, ex-reitor da Universidade de Paris, em virtude de seus conhecimentos superiores adquiriu reputação e imensa popularidade entre os grandes do clero e do Reino da França.

Mas não só isso. Suas virtudes fizeram dele o inimigo dos feiticeiros.

Nas reuniões noturnas em que esses assinavam pactos com o diabo, pediam ao príncipe das trevas meios para se livrar do sábio abade.

Tentaram vários ataques preternaturais contra ele, mas sem dúvida ele era protegido por um bom anjo, porque frustrava todos os truques perversos a tempo...

Um dia ... Mons. Balduíno teve que ir de Saint-Quentin a Dijon, na Borgonha.

Ficou claro que essa viagem foi mencionada nas reuniões nas quais Satanás comparecia ...

Nosso abade empreendeu a estrada a cavalo com seu criado Jean.

Depois de uma parada em Verberie, eles se aproximaram da floresta de Retz, que deviam atravessar.

Mas era ali que o diabo e sua tropa amaldiçoada os aguardavam ...

domingo, 15 de março de 2020

Como São Francisco domesticou as rolas selvagens

Luis Dufaur
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Um jovem havia apanhado um dia muitas rolas e levava-as a vender.

Encontrando-o São Francisco, o qual sempre sentia singular piedade pelos animais mansos, olhando com os olhos piedosos aquelas rolas, disse ao jovem:

“Ó bom moço, peço-te que mas dês, para que passarinhos tão inocentes, os quais são comparados na santa Escritura às almas castas e humildes e fiéis, não caiam nas mãos de cruéis que os matem”.

De repente aquele, inspirado por Deus, deu-as todas a São Francisco; e ele recebendo-as no regaço, começou a falar-lhes docemente:

domingo, 1 de março de 2020

Os três ducados


Luis Dufaur
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Era uma vez um homem como todos nós, nem melhor nem pior, um pobre pecador.

O que havia feito? Não sei. Uma falta talvez mais grave que as outras; um pecado maior que os outros, sem dúvida, quando Deus o abandonou à própria sorte.

Deus, evidentemente, não faltou; foi ele que não correspondeu.

E estava sendo conduzido à forca da cidade de Toulouse. Acompanhavam-no os juízes e o carrasco, em meio a uma multidão atraída por curiosidade, para ver o que aconteceria.

Ora, exatamente nesse dia, passava por Toulouse o rei René com sua esposa, a formosa rainha Aude, que ele acabara de desposar na pátria vizinha.

Passando em frente à forca, a rainha viu o condenado já empoleirado no banco, com a cabeça enlaçada pela corda. Não pôde conter um grito, e escondeu o rosto entre as mãos.

O rei deteve a todos, e fez sinal ao carrasco para que parasse. E voltando-se para os cônsules, disse:

— Senhores magistrados, a rainha vos pede, como sinal de boas vindas, que seja de vosso agrado conceder a esse homem o perdão.

domingo, 16 de fevereiro de 2020

A princesa do castelo de Wangenbourg

Ruínas de Wangenbourg
Luis Dufaur
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Num tempo longínquo morava no poderoso castelo de Wangenbourg, na Alsácia, um senhor muito encrenqueiro e de moralidade bastante duvidosa.

Ruínas de Wangenbourg
Voltando com seus companheiros de armas de uma expedição guerreira, ele viu uma bela donzela num prado florido.

Com ramalhetes de margaridas nos braços, ela resplandecia de beleza.

O senhor quis seduzi-la de todas as formas.

Mas, além de bela, nossa princesa fora abençoada no nascimento por um poderoso anjo, e tudo nela era maravilhoso.