domingo, 23 de abril de 2023

O milagre de Santa Cecília para o violinista ambulante

Gmund, na Suábia, Baviera, Alemanha
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs






Outrora, os habitantes de Gmund, na Suábia (Baviera, Alemanha), construíram magnífica igreja sob a invocação de Santa Cecília, a padroeira dos músicos.

Lírios de prata brilhavam como raios de luar em torno da santa, e rosas de ouro, como o resplendor da aurora, enfeitavam-lhe o altar.

Trajava a santa vestido de prata e calçava riquíssimos sapatos de ouro, porque naquele tempo, não somente na Alemanha, mas no mundo inteiro, os ourives de Gmund eram célebres pelo seu trabalho.

Santa Cecília, a padroeira dos músicos
Grande número de peregrinos dirigia-se à capela de santa Cecília, onde constantemente ressoavam sinos melodiosos.

Um dia chegou à cidade um pobre violinista, de faces pálidas e cavadas, e muito magro.

Caminhara durante longo tempo, estava fatigado e não tinha nem mais um pedaço de pão, nem a mais pequenina moeda de cobre.

Entrou na igreja, e tocou seu divino instrumento.

A santa comoveu-se com aquela melodia e com aquela miséria.

Fez um movimento, inclinou-se, descalçou um de seus sapatinhos de ouro e lançou-o nas mãos do pobre menestrel.

Louco de alegria, o mocinho saiu correndo, cantando, e deixou a igreja, dirigindo-se à casa de um ourives, a fim de vender o precioso presente.

O ourives, mal viu o sapato, reconheceu-o e fez prender o jovem músico, tratando-o como ladrão.

Conduziram-no ao juiz, foi julgado e condenado à morte.

Ressoou o sino, funebremente, tangendo pelo que ia morrer.

Numeroso cortejo pôs-se em marcha.

Anjo músico
Ouvia-se o canto solene dos monges, e, dominando-o, os sons do violino, porque o inocente músico pedira, como graça especial, que lhe deixassem conservar o instrumento e tocá-lo até seu derradeiro instante.

Quando passavam diante da igreja de Santa Cecília, ele rogou:

— Deixai-me entrar aqui uma última vez, e executar minha última harmonia!

Como a vontade dos que vão morrer é sagrada, permitiram-lho.

Entrou, prostrou-se diante do altar, e com mão trêmula fez vibrar o arco.

A santa, enternecida diante daquela dor, inclinou-se, descalçou o outro sapatinho de ouro e lançou-o às mãos do pobre músico.

Numerosa multidão assistiu àquele milagre, e todos viram como a santa protegia os músicos do povo.

O artista ambulante foi cercado, coroado de flores e carregado em triunfo até o palácio da justiça, onde os magistrados lhe ofereceram lauto banquete.



(Fonte: "Maravilhas do conto popular" - Cultrix, SP, 1960)


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domingo, 9 de abril de 2023

O tanoeiro de Arnsbourg

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




Há muito, muito tempo, um lenhador atravessava a floresta de Arnsbourg, entre Niederbronn e Mühltal, na Alsácia, França.

O calor estava insuportável e a seca ia longe, fazendo o pobre homem sofrer terrivelmente de sede.

Para a infelicidade do corajoso homem não havia córrego algum para dessedentá-lo.

Passando perto das ruínas de um antigo castelo, ele julgou sentir um bom odor de vinho, e pensou:

“Se houvesse pelo menos alguém que pudesse dar-me um pouco de vinho!”

Nessa hora, apareceu subitamente no meio das ruínas um homenzinho de longa barba branca, com um avental de couro e um maço de chaves no cinto, que lhe fez sinais amistosos e convidou-o a acompanhá-lo.

O lenhador decidiu seguir a mesma direção do tanoeiro sem fazer perguntas, e juntos pularam cada vez mais açodadamente de degrau a outro, em boa parte derruídos e cobertos de musgo.

Escadaria nas atuais ruínas do castelo de Arnsbourg
Escadaria nas atuais ruínas do castelo de Arnsbourg
Era essa a descida para o inferno?

O lenhador desconfiou, mas queria vinho. Sim, o vinho cujo perfume embriagante ele tinha farejado.

E quanto mais se afundava por essa escadaria desconhecida, mais crescia nele o desejo devorador de sorver o líquido da perdição.

De repente, o misterioso tanoeiro se deteve diante de uma imensa e sólida porta, e pegando uma gigantesca chave enferrujada que estava em seu maço, abriu-a.

Eles entraram numa grande adega com o teto em arcos, muito fresca e com um pequeno odor inebriante, forte e suave: o vinho!

Ruínas atuais do castelo de Arnsbourg.
Ruínas atuais do castelo de Arnsbourg.
O velho tanoeiro encheu com um líquido de maravilhosa cor sangue um copo de cristal finamente trabalhado, e oferecendo-o ao lenhador, disse:

– “Pega, bebe, é o mesmo vinho que bebia o senhor de Arnsbourg e que eu só podia lhe servir nos dias de festa. Eu fui seu tanoeiro, mas fui condenado a ficar aqui durante mais duzentos anos, sem poder gozar da paz eterna, porque quando estava vivo eu punha água no vinho dos servidores”.

O lenhador bebeu com grandes goles. Jamais havia provado um vinho tão bom. Nunca ficara com tanta energia, juventude e alegria.

E após agradecer ao tanoeiro com um sorriso, voltou para casa animado e com novas forças.

De volta à aldeia, ele contou toda a história, que se espalhou pela região.

Mas ninguém acreditou, pois as pessoas percebiam que ele tinha perdido o juízo.

Passou-se o tempo e muitos “pais da vida” e beberrões quiseram visitar as ruínas do castelo de Arnsbourg.

Mas o tanoeiro nunca mais voltou a aparecer.

Desde aquela época, em determinados anos, durante a floração dos vinhedos, os vinhateiros afirmam que um perfume agradável e subtil sai do chão e envolve todas as ruínas do castelo.

A tradição popular diz que nesses anos “haverá abundantes colheitas de uva na Alsácia, e que no outono as adegas se encherão de um vinho generoso”.

Mas, em são juízo, ninguém quer saber mais sobre o misterioso tanoeiro que enche os outros de vinho, mas lhes tira a razão.



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