domingo, 29 de outubro de 2023

O cavaleiro de Tundale visita o inferno


Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs





O cavaleiro irlandês Tundale aprendeu uma lição quando soldado, que nunca esqueceu.

Tundale era um bravo homem e bom soldado, mas não levava uma vida muito boa.

Um dia, enquanto estava sentado a uma mesa, caiu inconsciente e ficou naquele estado por três dias.

Quando recobrou consciência, era um homem mudado.

Começou a louvar a Deus e a fazer penitência por todas coisas más que tinha feito.

Por que mudança tão repentina?

Ele contou a seus amigos que, enquanto estava inconsciente, sua alma pareceu deixar o corpo, e ele se achou rodeado de demônios que queriam levá-lo para o inferno.

Os demônios atormentavam-no terrivelmente, até que seu anjo da guarda apareceu e expulsou-os.

Então o anjo conduziu-o através do inferno e purgatório, mostrando-lhe pessoas que tinha conhecido quando vivas.

Tundale disse a seu anjo o quanto ele tinha padecido nas mãos dos demônios, e o anjo lhe respondeu: “Tenho estado sempre ao seu lado, mas você nunca me pediu ajuda”.




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domingo, 22 de outubro de 2023

As lendas da Torre Sem Veneno

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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Acima de Grenoble, no pé das montanhas de Vercors, um pedaço de muro vigia o vale de Grésivaudan.

Essa ruína tem uma história, a dos senhores de Seyssinet. Aliás, sobre ela corre não uma lenda, mas muitas.



Terra de Jerusalém

Para que seus senhores partissem na Cruzada, o Delfim prometeu conceder terra aos corajosos. O senhor de Pariset soube quais terras lhe seriam doadas.

Era um belo lugar para construir seu castelo. Mas, estava infestado de cobras!

Tendo concluído vitoriosamente sua Cruzada, ele trouxe uma sacola com terra recolhida junto ao Santo Sepulcro em Jerusalém.

Ele lembrava que no jardim do Paraíso, o diabo entrou dentro da serpente e que desde então esse animal rasteiro infestava a terra. Ele achou que só uma terra que tocou em Nosso Senhor poderia expulsá-lo.

Voltando, espalhou a preciosa terra e o milagre aconteceu. Ele pôs em fuga todos os répteis venenosos que infestavam a região.

E um fabuloso castelo foi levantado naquele local antigamente amaldiçoado.

O mistério da mulher

Uma outra lenda conta que há muito tempo uma mulher curava as pessoas das picadas de serpentes.

Pois havia muitas cobras que moravam nas pedras de Vercors.

Os camponeses eram picados durante as colheitas, e as crianças se faziam morder reunindo feixes de galhos infestados com esse animal venenoso.

Todos eram curados por essa mulher de cabelos em desordem e mal penteados, e que agia secretamente.

Ela morava longe da aldeia, perto dos contrafortes de Vercors.

Com todo esse segredo e afastamento, a voz correu rapidamente: é uma bruxa! Pois uma mulher que se esconde para curar as picadas do diabo só pode recorrer à magia negra!

Foi ameaçada de ser levada à Justiça e punida com a morte. Então ela revelou seu segredo.

Ela tinha descoberto, um dia que foi picada por esse animal do diabo, que aplicando a terra do local misturada com ervas, a febre ia embora.

Desde então, ela virou a médica oficial da aldeia e a região ganhou o nome de SANS VENIN (SEM VENENO).



O senhor feudal bom

Mas, há ainda uma outra lenda: a do senhor feudal pacífico.

Houve um nobre senhor de Pariset, descendente do cruzado, que não era nada belicoso.

Ele sempre achava um jeito de arranjar as coisas sem usar violência.

Não era um homem covarde ou moleirão, nem mesmo carente de coragem.

Acontecia que ele tinha visto tantas guerras e tantos mortos que ele adotou o costume de sempre procurar um arranjo salutar para o bem de todos.

Foi assim que o povo dizia que ele não fazia mal, e que tudo o que falava era SANS VENIN.




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domingo, 15 de outubro de 2023

A perfeita alegria segundo São Francisco de Assis

San Francisco e a perfeita alegria
San Francisco e a perfeita alegria
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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Vindo uma vez S. Francisco de Perugia para Santa Maria dos Anjos com frei Leão, em tempo do inverno, e o grandíssimo frio fortemente o atormentasse, frei Leão perguntou-lhe:

São Francisco recebe os estigmas, <span class="st"><em>Giotto</em> di Bondone (1267 — 1337), Museu do Louvre
São Francisco recebe os estigmas,
Giotto di Bondone (1267 — 1337), Museu do Louvre
‒ Pai, peço-te, da parte de Deus, que me digas onde está a perfeita alegria.

E São Francisco assim lhe respondeu:

“‒ Quando chegarmos a Santa Maria dos Anjos, inteiramente molhados pela chuva e transidos de frio, cheios de lama e aflitos de fome, e batermos à porta do convento, e o porteiro chegar irritado e disser:

“‒ Quem são vocês?

“E nós dissermos:

“‒ Somos dois dos vossos irmãos, e ele disser:

“‒ Não dizem a verdade; são dois vagabundos que andam enganando o mundo e roubando as esmolas dos pobres; fora daqui!

“E não nos abrir e deixar-nos estar ao tempo, à neve e à chuva, com frio e fome até à noite: então, se suportarmos tal injúria e tal crueldade, tantos maus tratos, prazenteiramente, sem nos perturbarmos e sem murmurarmos contra ele (...) escreve que nisso está a perfeita alegria.

“E se ainda, constrangidos pela fome e pelo frio e pela noite batermos mais e chamarmos e pedirmos pelo amor de Deus com muitas lágrimas que nos abra a porta e nos deixe entrar, e se ele mais escandalizado disser:

“‒ Vagabundos importunos, pagar-lhes-ei como merecem.

“E sair com um bastão nodoso e nos agarrar pelo capuz e nos atirar ao chão e nos arrastar pela neve e nos bater com o pau de nó em nó:

“Se nós suportarmos todas estas coisas pacientemente e com alegria, pensando nos sofrimentos de Cristo bendito, as quais devemos suportar por seu amor:

“Ó irmão Leão, escreve que aí e nisso está a perfeita alegria, e ouve, pois, a conclusão, irmão Leão.

“Acima de todas as graças e de todos os dons do Espírito Santo, os quais Cristo concede aos amigos, está o de vencer-se a si mesmo, e voluntariamente pelo amor suportar trabalhos, injúrias, opróbrios e desprezos”.



(Fonte: “Fioretti de São Francisco”, excerto)


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domingo, 8 de outubro de 2023

A lenda de São Goar e o colar de Carlos Magno

São Goar
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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São Goar foi sacerdote e confessor na cidade de Tréveris (Trier). Sua festa litúrgica, inscrita no Martírológio Romano, comemora-se a 6 de julho. Exerceu grande influência moral na região que vai desde Estrasburgo, na França, até Nimega, na Holanda.

Uma pequena cidade situada às margens do Reno, na Alemanha, leva o nome do Santo. É aí que se pode ouvir o relato de sua lenda.

São Goar era contemporâneo de Carlos Magno, e em consequência assistiu à luta do grande Imperador contra os infiéis. Portanto muito tempo o Santo lamentava amargamente não poder ajudar o filho de Pepino de outro modo, a não ser com suas orações.

São Goar era não somente eremita, mas também barqueiro. Ele estava tomado por essa pena ao ir recolher um viajante na margem direita do Reno, que lhe tinha feito sinais para vir erguê-lo. Nisso, subitamente, veio-lhe uma ideia que lhe pareceu ser de tal maneira uma inspiração do Céu, que resolveu colocá-la em execução no mesmo instante.

Com efeito, assim que São Goar chegou com o viajante ao meio do Reno, ou seja ao ponto onde o rio é mais rápido e profundo, parou de remar e perguntou a seu passageiro de que religião era.

Tendo tomado conhecimento de que estava diante de um herege, deixou o remo, jogou-se sobre ele, batizou-o de uma vez em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Em seguida, de medo de que um Batismo assim ministrado perdesse seu efeito salutar, jogou o novo convertido no rio, que o conduziu diretamente ao Paraíso.

O rio Reno na altura de São Goar
O rio Reno na altura de São Goar
Na mesma noite, a alma do afogado apareceu a São Goar e, em vez de lhe fazer censuras sobre a maneira um pouco brutal pela qual o havia forçado a sair deste mundo, agradeceu por haver-lhe alcançado a felicidade eterna.

Não foi preciso mais ao Santo, dadas suas disposições naturais, para lançá-lo nesta nova via apostólica. Assim, a partir daquele memento, poucos dias não foram marcados por alguma nova conversão.

Quando prestava serviço a um católico, pelo contrário, São Goar não se contentava em fazê-lo atravessar o Reno, conduzia-o a sua ermida e lá partilhava com ele os dons que a piedade dos fiéis ali deixava com uma prodigalidade que, aumentando de hora em hora, provava que a reputação do Santo crescia a olhos vistos.

Ora, aconteceu que essa grande reputação chegou até Carlos Magno, que apreciou o meio de conversão adotado por São Goar, e resolveu não deixar um tão poderoso auxiliar sem recompensa.

Ele foi, então, como simples forasteiro para passar o Reno, e tendo feito o sinal de costume, viu chegar até ele o bom eremita. Mas seu desejo de passar o rio incógnito ficou sem resultado, pois Deus tinha gravado em sua fisionomia uma tal majestade, que São Goar reconheceu-o antes mesmo que tivesse posto o pó na barca.

Semelhante hóspede devia deixar marca de sua passagem. Assim, chegando à outra margem, e tendo bebido um vinho que lhe pareceu agradável, Carlos Magno pediu informações sobre a terra que o produzia, e, tomando conhecimento que estava à venda, comprou-a e fez dela presente para o eremita, prometendo enviar-lhe também um barril e um colar.

Efetivamente, algumas semanas depois da passagem do Imperador, São Goar recebeu os dois objetos prometidos. Ambos eram milagrosos e cada um tinha uma propriedade peculiar. O barril permanecia, sempre cheio, contanto que não se tirasse vinho a não ser pela torneira.

Carlos Magno
Quanto ao colar, era algo bem diferente. Na expansão do contacto pessoal, São Goar se tinha queixado a Carlos Magno da má fé dos infiéis, que agora, sabendo dos hábitos de São Goar, em vez de confessarem sua heresia, respondiam pura e simplesmente que eram católicos, atravessavam o rio protegidos por este titulo e, quando estavam na outra margem, bebiam seu vinho e iam embora zombando dele. Não havia remédio para isso, sendo que nada se assemelhava tanto a um católico como um infiel que fazia o sinal da Cruz .

Era este inconveniente que o Imperador Carlos havia prometido obviar, e foi para cumprir sua promessa que enviou o colar.

Com efeito, o colar tinha uma virtude peculiar: apenas tocava a pele, sentia de quem se tratava:
– Se era um católico, permanecia no seu statu quo, e deixava passar tranquilamente o vinho da boca ao estômago;
– Se era um infiel, apertava-se imediatamente até ficar reduzido à metade, de sorte que o bebedor soltava o copo, punha a língua e revirava os olhos. Então, São Goar, que ficava perto dele com uma taça cheia d'água, batizava-o prontamente, e o sistema voltava ao que era antes.

Eram portanto dois presentes inapreciáveis e bem pensados para estarem juntos: o barril e o colar.

São Goar percebeu o valor desse dom. Assim, não só durante toda a sua vida fez uso dele, mas ainda ordenou aos monges ― que se tinham reunido em torno dele, e que ainda em sua vida haviam fundado uma abadia, da qual ele era o superior ‒ de fazerem uso dele depois de sua morte.

Os monges não se omitiram, e o colar e o barril milagrosos atravessaram séculos conservando seu poder.


(Autor: Alexandre Dumas, « Excursions sur lés bords du Rhin - Impressions de Voyage », Calmann-Levy Editeurs, Paris, Tomo II, pp. 49 a 56).


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