Banquete medieval |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
O conde Henrique tinha por senescal um homem duro, avaro e cruel. Sempre que o conde fazia alguma obra de caridade, ele se condoía muito pela perda do patrão.
Não porque zelasse desinteressadamente pelos bens do conde, mas, pelo contrário, porque roubava constantemente da mesa vinho, caças e outros alimentos, que depois devorava às escondidas. E não queria que outros compartilhassem com ele os bens do conde.
Isso ocasionava algumas vezes, sobretudo quando havia visitas, cenas hilariantes com as quais se divertia o conde.
Mas outros que viam isso não achavam graça, e desejavam que o senescal fosse de alguma forma punido por sua avareza.
Um dia o conde anunciou que ia dar uma festa, para a qual estavam convidados todos os seus vassalos, altos e baixos, ricos e pobres. Festa suntuosa.
As portas do castelo estavam abertas de par em par, e por todo lado havia mesas cheias dos manjares mais diversos. Compareceram cavaleiros, damas, donzelas, escudeiros, jovens, jograis e menestréis.
O avarento senescal pensava com seus botões: “Toda essa gentalha parece não ter comido durante todo o ano! Como comem! Vão acabar deixando a despensa vazia!”
Mas, como precisava agradar ao patrão, dissimulava a raiva e dizia aos convidados, com sorriso hipócrita:
— Servi-vos bem, senhores! Comei e bebei à vontade!
Todos se haviam assentado e a festa começado, quando chegou um pobre lavrador, que comparecia depois de terminada sua faina diária.
Vendo-o, o senescal se enfureceu e descarregou sobre ele toda a raiva que havia acumulado, gritando com o pobre homem:
— O que está querendo aqui? O que é que perdeu nesta casa?
— Eu vim comer, pois fui convidado como todos os outros e estou com vontade de comer. Por favor, arranje-me um lugar para sentar-me, pois não estou vendo nenhuma cadeira vazia.
— Lugar para sentar? Aí tens um lugar para sentar — disse o senescal, enquanto dava um chute no traseiro do camponês.
Logo depois o senescal se arrependeu, por medo de que o fato chegasse ao conhecimento do conde, e resolveu apaziguar o lavrador, pedindo-lhe perdão e arranjando-lhe um lugar.
Sorrindo, o lavrador demonstrou que não guardava rancor, mas de fato esperava a ocasião adequada para vingar-se. Comeu e bebeu à vontade, e depois passou com os outros para o salão.
Menestreis da Cantiga de Santa Maria, anónimo espanhol |
O prêmio era valioso, e então os jograis cantaram as mais belas canções, outros fizeram passes, outros imitaram os bêbados e loucos, alguns imitaram brigas de mulheres, cada um se esforçando por fazer o que julgava mais engenhoso.
O lavrador olhava e se divertia como todos os outros, no salão repleto.
Quando tudo terminou, o lavrador se aproximou por trás do senescal, que estava de pé ao lado do conde, e lhe deu um tremendo ponta-pé no traseiro, que o fez estatelar-se de bruços no chão. E disse em voz bem alta:
— Aí está a cadeira que me emprestaste. Como estás vendo, entre gente honrada nada se perde.
A queda do senescal provocou grande sensação. Os criados acorreram, uns para socorrer o senescal, outros para deter o lavrador. Depois o conde o interrogou:
— Por que fizeste isso com o senescal?
— Senhor, disseram-me que eu poderia vir aqui hoje para a festa, e eu, muito agradecido em relação a vós, compareci, embora um pouco tarde, pois outros haviam chegado antes e tomado todos os assentos. Pedi então ao vosso senescal que me conseguisse um local onde pudesse sentar-me, e ele me deu um ponta-pé, dizendo que estava me emprestando uma cadeira. Como eu já comi e bebi, não tenho mais necessidade da cadeira, e estou devolvendo-a, com um certo acréscimo por conta dos juros. Asseguro-vos, senhor, que não tenho comigo nada mais que seja vosso, pois sou pobre mas tenho a consciência limpa. Mas se o senescal julgar que o valor do aluguel foi insuficiente, estou disposto a completá-lo.
Quando ouviram tal explicação, o conde e os convidados deram gostosas gargalhadas. Enquanto isso o senescal se levantara e massageava a parte dolorida, o que aumentou ainda mais as gargalhadas.
Riram tanto, que afinal o conde acabou dando a roupa escarlate como prêmio ao lavrador, e todos os jograis e menestréis concordaram que era merecido.
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