domingo, 8 de julho de 2018

Como os corvos enganaram as corujas

Patronio: "com certeza esse homem veio para vos enganar".
Patronio: "com certeza esse homem veio para vos enganar".
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs





O Conde Lucanor falando com Patronio, seu fiel conselheiro, disse:

– Patronio, estou em luta contra um inimigo muito poderoso. Ele tinha em sua casa um parente criado junto com ele e a quem ele tinha favorecido muitas vezes.

Mas, por causa de uma disputa entre eles, meu inimigo causou graves danos e desonrou seu parente ao qual devia muitas coisas.

O parente, pensando em aquelas ofensas e procurando forma de se vingar, quer se aliar comigo.

Acredito que vai ser um homem muito útil, porque poderia me aconselhar o melhor modo de fazer dano a meu inimigo, sendo que o conhece muito bem.

Pela grande confiança que vós mereceis e pelo vosso bom senso, vos rogo que me aconselheis sobre o modo de resolver esta questão.

– Senhor Conde Lucanor – disse Patronio – o primeiro que vos devo dizer é que com certeza esse homem veio para vos enganar.

E para que saibas como tentará consegui-lo, gostaria que soubesses o que aconteceu entre os corvos e as corujas.

O conde quis saber do que tinha acontecido naquele caso.

– Senhor Conde Lucanor – começou Patronio – os corvos e as corujas estavam em guerra entre si e os corvos levavam a pior parte porque as corujas só voam pela noite e no dia ficam escondidas em locais muito ocultos.


Os corvos em guerra com as corujas
Os corvos em guerra com as corujas
Elas voavam ao amparo da escuridão até as árvores onde aninhavam os corvos, golpeando e ferindo a todos quantos podiam.

Os corvos sofriam demais. Um deles muito esperto, vendo o grave dano que padeciam os seus, falou com seus primos corvos e encontrou um meio para se vingar das inimigas corujas.

Eis o modo que ele imaginou e pôs na prática: os corvos lhe arrancaram as plumas, exceto de alguma das asas, e por isso voava muito pouco e mal.

Assim recoberto de feridas foi ter com as corujas. Contou-lhes o mal e o dano que lhe causaram os corvos porque ele não queria a guerra contra as corujas.

Propôs, então, às corujas que se elas o aceitavam como companheiro estava disposto a lhes revelar as melhores formas de se vingar dos corvos e lhes fazer muito estrago.

Ouvindo isso, as corujas ficaram contentes porque acharam que com esse aliado poderiam derrotar a seus adversários os corvos. Então começaram a trata-lo muito bem e o tornaram partícipe de seus planos secretos e de seus projetos para a luta.

Porém, entre as corujas havia uma muito velha e experiente. E quando ficou sabendo a história do corvo, descobriu o engano que aprontava.

Foi então a explicar a trama à cabecilha das corujas, afirmando com toda certeza que aquele corvo foi se juntar com elas para conhecer seus planos e preparar sua derrota. Por isso tinham que afasta-lo logo dentre elas.

Mas a coruja sabida não conseguiu que seus irmãos lhe fizessem caso. E, vendo que não acreditavam nela, se afastou de todos e foi viver num local onde os corvos não poderiam encontra-la.

E as corujas, pese a tudo, continuaram confiando no corvo.

Quando as plumas lhe cresceram mais uma vez, o corvo disse às corujas que podendo voar, iria procurar os corvos e voltando contaria para as corujas onde estavam.

Então, as corujas todas se reunindo poderiam acabar com seus inimigos. E as corujas ficaram muito contentes.

As corujas acharam mais gstoso acreditar na mentira do corvo.
As corujas acharam mais gostoso acreditar na mentira do corvo falso amigo.
Chegando o corvo onde estavam seus irmãos, ajuntaram-se todos e ficaram sabendo dos planos das corujas e as atacaram de dia, quando elas não voam e ficam tranquilas.

E sem nada temer, as destroçaram e mataram tantas corujas que os corvos ficaram como únicos vencedores.

Assim aconteceu às corujas por confiar no corvo que, por natureza, é inimigo delas.

Vós, senhor Conde Lucanor, sabeis que esse homem que quer se aliar convosco deve vassalagem a vosso inimigo. Por isso, ele e toda sua família são vossos inimigos também.

Aconselho-vos que o afasteis da vossa companhia porque é certo que pretende vos enganar e procura vosso mal.

Porém, se ele quiser vos servir desde fora de vossas terras, de maneira que nunca conheça vossos planos e não possa vos prejudicar e se verdadeiramente fizer tanto estrago àquele inimigo vosso de forma a nunca mais poder fazer as pazes com ele, então podereis confiar nesse parente despeitado, fazendo-o sempre com cautela para que não vos possa resultar perigoso.

O conde julgou que esse era um bom conselho, agiu de acordo com ele e lhe foi muito proveitoso.

O príncipe Dom João entendeu se tratar de um conto muito bom, mandou-o escrever neste livro e compôs estes versos que dizem assim:

“Aquele que antes costumava teu inimigo ser

Nem em nada nem nunca lhe deves crer”.

(Fonte: «El Conde Lucanor», Alicante, Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2004. Conto XIX, págs. 82-84) 



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