domingo, 11 de abril de 2021

Nossa Senhora e a monja fugitiva

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs





Num antigo e austero mosteiro habitava uma monja muito jovem, chamada Beatriz, de grande piedade em sua vida religiosa e profundamente devota de Santa Maria, a quem consagrara a metade de sua vida.

Continuamente a viam de joelhos diante do seu altar, em fervorosa veneração, oferecendo sua esplêndida juventude e angélica pureza à sua Santíssima Mãe.

A abadessa e todas as irmãs do convento lhe professavam grande carinho, por sua bondade e doçura, e a nomearam para o cargo de sacristã da igreja, que ela desempenhava com grande zelo.

Porém, sendo Beatriz extraordinariamente bela, despertou a paixão de um clérigo que freqüentava o mosteiro. Tentou convencê-la a fugir do convento com ele. Mas Beatriz, que a princípio resistia com firmeza, sentia desfalecer suas forças ante os embates daquela forte tentação.

Procurava rezar, porém sua devoção se havia convertido em aridez de espírito, e sua imaginação voava muito longe, sentindo fastio na oração. Numa ocasião em que a igreja estava deserta, o enamorado conseguiu enfim que a monja consentisse em fugir com ele.

Antes de partir, ela se prostrou de joelhos ante a Virgem, dizendo:

— Soberana Senhora, eu te servi honestamente durante a vida toda, até hoje, e não posso conter esta força que me arrasta longe de ti. Entrego-te e te encomendo as chaves desta igreja.

E depositando as chaves sobre o altar, fugiu com o clérigo.

Transcorreu pouco tempo, e o clérigo, uma vez satisfeita sua paixão, abandonou Beatriz, que caiu com a alma desgarrada e grande confusão de espírito.

Sem atrever-se a voltar ao convento, transformou-se numa mulher pública, levando vida ímpia e vergonhosa durante quinze anos, torturada pelos remorsos de sua consciência e conservando uma vaga esperança de perdão.

Passava um dia diante do mosteiro, e sentiu o desejo de parar, para saber o que pensavam da irmã sacristã.

Aproximou-se da porteira do convento, e perguntou:
— Diga-me, irmã, como está Beatriz, a sacristã?

A porteira respondeu:
— Vai muito bem, tão santa e devota como sempre, desempenhando maravilhosamente seu ofício de sacristia. Todas as religiosas a admiram. Já está no convento há vinte e seis anos, demonstrando grande piedade.

Beatriz ficou pensando nas misteriosas palavras que acabava de ouvir, mas sem poder compreendê-las. Então lhe apareceu a gloriosa Virgem, dizendo:
— Beatriz, minha filha, durante quinze anos, em figura tua, Eu desempenho o ofício de sacristã. 

Volta ao mosteiro, e continua servindo como se nunca tivesses saído, porque nada sabem de teu pecado. Crêem que continuas em teu posto. Faze penitência para alcançar o perdão de teus muitos pecados.

E nesse momento desapareceu. Beatriz regressou ao convento, e voltando a tomar seus hábitos e as chaves, continuou o ofício de sacristã, sem que ninguém chegasse a se dar conta de sua volta.

Unicamente o confessor, a quem revelou sua vida e seus pecados, era conhecedor daquele milagre.

Impôs-lhe severas penitências, que Beatriz cumpriu com rigor, edificando suas companheiras com o exemplo de suas virtudes heroicas e sua santa vida cheia de sacrifícios, para expiar suas culpas.

Chegada sua última hora, Beatriz chamou toda a comunidade, que a rodeou em seu leito de morte, e em alta voz confessou seu pecado, descobrindo o prodígio de misericórdia operado por Nossa Senhora, que durante quinze anos desempenhou por ela o cargo de sacristã. Foi tudo isso atestado pelo confessor.

E morreu santamente naquele instante.

Todas as monjas ficaram admiradas daquele portento, e deram graças à sua Mãe Celestial, que havia feito aquele favor para a religiosa.



(V. Garcia de Diego, Antología de Leyendas de la Literatura Universal - Labor, Madrid, 1953)
 


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